Há alguns anos atrás passou por essas bandas, certo
homem, de aparência estranha e que despertava em cada ser que o olhava certa
repugnância e nojo.
O pobre ao aproximar-se das crianças metia-lhes medo e
fazia com que algumas corressem apavoradas enquanto outras, em coro, entoavam
em hino... “doido, doido, doido...”
E faziam troça dele, riam e se divertiam com o mesmo.
Algumas crianças,
mais malvadas, chegavam a jogar pedras, ferindo-lhe.
Alguns pais repreendiam seus filhos ensinando-os que não
podemos humilhar machucar ou rir de quem quer que seja ensinando a seus filhos que
fomos criados a imagem e semelhança de Deus e que o hoje pode nos favorecer
perante os outros, aparentemente, e o amanhã pode nos cobrar nossa falta de
amor diante de nossos irmãos.
Outros fingiam não perceber o que seus filhos faziam
dando de ombros e até justificando suas atitudes por ser o mesmo um
desconhecido, que não deveriam ter contato com o mesmo e que o melhor seria
enxotar dali aquele que não fazia parte das famílias da comunidade.
Os restantes além de apoiarem, incentivavam as crianças
para que maltratassem àquele desconhecido, desgraçado que por ali parava.
Quando as casas exalavam o cheiro do almoço, as portas e
janelas se fechavam para não dividirem com aquele ser o pão precioso que
serviria para alimentar suas fomes.
De todas as casas daquele lugarejo somente um pequenino
casebre mantinha aberta sua portinhola convidando àquele desprezado a
achegar-se e adentrar para cear a pouca ceia que se preparava.
Na casa de dona Sinhana, aquele pobre homem, encontrava
aconchego, amor e alimento para o corpo fraco e cansado das pedradas doídas,
atiradas por aqueles que não conseguiam compreender o sofrimento alheio.
Diante da tanta bondade o homem que recebia da velhinha,
todos os dias, amor, carinho e comida, reparando nos arredores viu que naquele
lar maravilhoso a higiene só se encontrava nas panelas que pareciam espelho e
ofereceu ajuda para assear a casa que o abrigava todos os dias para o almoço.
No primeiro dia retirou todo o lixo que ali se acumulava.
Era tanto que no final da tarde o mesmo ainda não tinha terminado de limpar
tanta sujeira. A partir daí o mesmo começou a intrigar-se com a velhinha que o
acolhia com tanto amor. Percebia que seu fogão a lenha era branquinho
passadinho de barro branco e suas vasilhas sempre limpinhas. Mas o restante
não.
No outro dia, acordou, levantou-se, e antes da meninada
passar em frente ao abrigo para a escola, rumou para a casa de D. Sinhana com o
intuito de terminar o que havia começado.
Acabou de retirar o lixo da casa e começou a limpar o quintal que também
acumulava não só lixos como também grande quantidade de mato.
Quando terminou à tarde ela lhe ofereceu uma muda de
roupa, cheirando a naftalina, de um filho que partira a tanto que nem mais se
lembrava o quanto.
Ele tomou banho limpou as feridas, olhou-se no espelho
depois de muitos anos e chorou...
Chorou copiosamente o choro de todas as pedradas que a
vida havia lhe dado e o mesmo fingira não sentir. Passou a mão pelo rosto
barbudo e cheio de cicatrizes e feridas, olhou seus cabelos longos, agora
tingidos de uma cor que não era mais aquele misto de sujeira e emprasto, e
lembrou-se quantas vezes aqueles cabelos loiros foram afagados por mãos
amorosas.
Depois de um longo
tempo sentiu-se com a alma lavada e olhou dentro de seus olhos vermelhos de
tanto chorar e os viu azuis iguais ao da velha senhora que lhe acolhia todos os
dias para dar-lhe alimento.
Foi-se. E naquela
noite rememorou todos os sonhos de antes.
Levantou-se e com o mesmo barro que a velhinha caiava o
fogão caiou toda a casinha que há muito perdera a cor.
Para dar um toque especial foi até o quintal, retirou
outras cores de argila e passou um lindo barrado amarelo na casa por dentro e
por fora. Com a argila rosa desenhou ramos de flor na parede da rua. Quando
terminou, entrou, banhou-se, deu um longo abraço de gratidão naquela que recussitara-lhe
a vida e ainda intrigado perguntou-lhe onde estava o filho. Ela chorando disse
que logo na esquina. Ele era o dono da venda, e que como era cega ele e a
família a abandonara ali.
Abraçou-a mais uma vez pegou um par de andrajos da
velhinha e um seu e pendurou-os à porta.
Quando foi embora já com grande parte de suas feridas
cicatrizadas passou pela rua sob os olhos perplexos e curiosos daquele
vilarejo que indagava...
Quem era aquele belo homem?
Márcio Campos
6 comentários:
Adorei o texto. mas cofesso: eu era uma das crianças que gritava doido para o homem. Os meus país, coitados, não sabiam o filho que tinham.
Um abraço
Paulo, obrigado pelo comentário. Estou em dívida com vc. Vou visitá-lo.
Um abraço.
clap clap clap... que texto belissimo... este é meu amigo Marcio... :)... Esquecestes o caminho da Ilha? :( Estou passando para te convidar para o 6º Pena de Ouro e conto com tua presença no meu Ostra da Poesia – te espero na Ilha. Um beijo enorme no coração.
OLÁ ESTOU SEGUINDO VIM ATÉ AQUI ATRAVÉS DO BLOG DA LINDALVA ABRAÇO E PARABÉNS PELO SEU CANTINHO CHEIO DE ENCANTO!!!
Amigo por onde andas? que aconteceu? :( já passamos o 6º e amanhã começa o 7º Pena... dá notícias :( beijos no coração.
Oi Márcio,
que lindo o teu blog, muito
interessante e convidativo.
Seguindo-te!
Beijos
Eu! Leilinha
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